Encontro de chefes de Estados deve influenciar debate de ministros, que pode se estender até sexta (19); cerca de 10 mil ruralistas ameaçam invadir capital belga em protesto contra tratado negociado há 26 anos
BERLIM, ALEMANHA (FOLHAPRESS) – Duas reuniões em dois Conselhos que se estendam talvez por dois dias. Esse é o cenário que promete definir o futuro do acordo União Europeia-Mercosul a partir desta quinta-feira (18), em Bruxelas. Para completar, cerca de 10 mil ruralistas ameaçam ocupar as ruas de Bruxelas para protestar contra o tratado que começou a ser negociado em 1999.
Grupo liderado pela França e que ganhou apoio decisivo da Itália nos últimos dias quer adiar a aprovação. Alemanha, Espanha e países nórdicos defendem a aprovação imediata e sugerem que a procrastinação terá consequências.
Uma delas foi verbalizada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva na quarta (17). Se o acordo não for aprovado para finalmente ser assinado no sábado (20), no Brasil, não será mais concluído em seu mandato.
Conheça detalhes da disputa e os ritos de deliberação que podem viabilizar ou não o acordo capaz de reunir 722 milhões de consumidores, em uma das maiores zonas de livre comércio do mundo, e fazer o PIB brasileiro crescer 0,48% anualmente até 2040, segundo projeção do Ipea.
DOIS CONSELHOS
O futuro do acordo UE-Mercosul depende de duas reuniões que ocorrem concomitante em Bruxelas nesta quinta (18) e na sexta (19). Uma é a do Conselho Europeu, que reúne chefes de Estados e delibera sobre assuntos de fundo da política europeia.
A outra é a do Conselho da União Europeia, que ocorre em vários formatos, mas sempre com representantes específicos ao assunto abordado, em geral ministros. Esse comitê é responsável, entre outras coisas, por aprovar legislações e tratados internacionais, caso do acordo UE-Mercosul.
O tratado está na pauta de sexta do Conselho da UE, mas é improvável que não seja discutido também hoje, dada a urgência do assunto e o debate em tons elevados que o tema gerou nesta semana na Europa.
O acordo não consta da pauta do Conselho Europeu, mas também é improvável que não vire assunto durante o encontro entre os mandatários dos 27 países-membros. A intransigência de Emmanuel Macron, principal oponente do acordo, e a adesão de Giorgia Meloni à dissidência criada pelo presidente francês certamente serão abordadas pelos defensores do pacto, Alemanha à frente.
DUAS PAUTAS
O assunto mais importante do dia em Bruxelas não é o acordo UE-Mercosul. A principal querela é como viabilizar o chamado empréstimo de reparação à Ucrânia. A Comissão Europeia, o braço executivo do bloco, defende que ativos russos congelados no sistema bancário europeu sejam usados como lastro do empréstimo a Kiev.
Este, por sua vez, só seria quitado pela Ucrânia se a Rússia no futuro pagasse indenização pelos estragos da guerra. A manobra heterodoxa, que envolveria mais de € 200 bilhões, apavora representantes do sistema bancário, agências de risco e, é claro, o Kremlin. O presidente russo, Vladimir Putin, chamou os europeus de “porcos” nesta semana.
O tema, divisivo como o acordo de livre comércio, também tem a primeira-ministra italiana como potencial fiel da balança. Seu posicionamento pode ser decisivo para demover a Bélgica, principal oponente da estratégia -os recursos estão congelados em Bruxelas, e o país teme ser responsabilizado pelo valor se eventualmente a guerra acabar.
O quanto a discussão influencia o debate sobre o Mercosul é uma incógnita. Seria ingênuo imaginar, no entanto, que as conversas, em maior ou menor grau, não irão se misturar em algum momento.
DOIS DESFECHOS
Para ser aprovado no Conselho da UE, que é a reunião de ministros, o acordo precisa de uma maioria qualificada: votos de 14 dos 27 países-membros que correspondam ao menos a 65% da população do bloco. A França articula o caminho contrário, que é formar uma minoria de bloqueio: aos menos 4 países, que correspondam a 35% da população.
Com o apoio da Itália e os votos certos de Polônia e Hungria, que são contra o acordo, o governo francês teria capacidade de frear o debate. A Dinamarca, que exerce a presidência rotativa da UE neste semestre, tiraria o assunto de pauta, acatando o adiamento pedido por Paris.
Se Meloni mudar de ideia, aí a votação tem destino certo. A aprovação, no entanto, abriria um precedente político importante no bloco: nunca um tratado desse porte foi aprovado sem a anuência de algum dos Estados fundadores da UE. Isso provavelmente tomaria conta da discussão no Conselho Europeu, do outro lado do prédio, em um momento já muito complexo da política do continente.
DOIS DIAS
O acordo não precisa ser aprovado agora, mas um adiamento poderia ser entendido como um fiasco, prova da incapacidade de ação do bloco europeu. O prognóstico foi feito na quarta pelo premiê alemão, Friedrich Merz, em discurso no Bundestag. Alemanha, Espanha e países nórdicos são os principais defensores do tratado, que veem como saída de mercado para a competição chinesa e resposta ao tarifaço de Donald Trump.
Sendo aprovado, a ideia é que Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, chegue ao Brasil no sábado (20) para a cerimônia de assinatura, como planejado e já divulgado pelo governo Lula.
Dado curioso, isso estabelece um prazo para que o debate em Bruxelas seja concluído. Von der Leyen só usa voos de carreira, o que em tese a obriga a embarcar na noite de sexta (19) no horário europeu.
Acordo UE-Mercosul depende de duas reunião em Bruxelas até sexta
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