Governo dos EUA avança na análise das tarifas impostas ao Brasil por Trump e inicia escuta formal de empresas americanas afetadas. Negociações ganham tom técnico e podem levar à suspensão parcial das sobretaxas, com setores estratégicos como café e carne buscando isenção ou inclusão em futuras exceções
(FOLHAPRESS) O governo dos Estados Unidos deu um passo adiante na análise das tarifas impostas pelo presidente Donald Trump ao Brasil e começou um processo para ouvir empresas americanas atingidas pelas sobretaxas.
As reuniões são focadas nas taxas de 40% aplicadas pelo governo americano e que tiveram como justificativa motivações políticas, como o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Segundo um interlocutor do governo americano, o USTR (Escritório do Representante de Comércio dos EUA) determinou que todas as companhias que queiram tratar do assunto sejam escutadas pelo próprio órgão e pelo Departamento de Estado.
A ordem foi dada após a reunião realizada entre o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, e o secretário do Departamento de Estado americano, Marco Rubio, na semana retrasada. O encontro foi interpretado pelos americanos e pelos brasileiros como a largada efetiva das negociações tarifárias.
Integrantes da comitiva americana relataram a interlocutores terem saído da conversa com Lula na Malásia com boa impressão, indicando boa vontade em chegar a um acordo.
O USTR já ouviu formalmente uma série de empresas no âmbito da investigação tarifária aberta com base na chamada Seção 301. Vinculado a uma legislação americana de 1974, o regulamento autoriza o governo dos EUA a retaliar, com medidas tarifárias e não tarifárias, qualquer nação estrangeira que tome práticas vistas como injustificadas e que penalizam o comércio americano. China e União Europeia já foram alvo.
O novo processo de escuta das empresas, porém, não seria vinculado à Seção 301 e teria como objetivo levantar as demandas das empresas americanas para incluir esses pedidos nas negociações com o Brasil. Segundo pessoas ligadas a empresas ouvidas nas discussões, isso indica a intenção dos EUA de progredirem efetivamente nas tarifas.
Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior e sócio do escritório Barral Parente Pinheiro Advogados, confirmou que o USTR está aceitando reuniões com companhias americanas interessadas em falar sobre o Brasil. “O USTR está se reunindo com as empresas que estão pedindo para falar sobre o Brasil, para ver se elas têm elementos para colocar na mesa de negociações”, afirmou ele.
Federico Lamego, superintendente de relações internacionais da CNI (Confederação Nacional da Indústria), avalia que a liderança do USTR mostra que as negociações estão se encaminhando para um perfil técnico, o que contribui para uma eventual suspensão das tarifas avançar.
“Estamos com uma grande expectativa que haja um bom desfecho, com a possibilidade de algum tipo de suspensão temporária das tarifas de 50%”, afirma. “O fato de o USTR liderar as negociações é importante, já que deve levar a uma agenda técnica entre os dois lados.”
Ele afirma que o USTR tem como tradição ouvir as empresas sobre como proceder nas negociações com outros países, e o fato de ter determinado reuniões com empresas americanas indica que esse é o primeiro passo para a construção de um acordo.
A CNI defende que o acordo com os EUA seja mais amplo — ou seja, que não se restrinja à questão tarifária — para elevar a chance de um avanço nas tratativas.
“Acreditamos que o acordo deve incluir compromisso de investimentos de empresas brasileiras nos Estados Unidos, compras governamentais de produtos americanos em defesa e alianças estratégicas, como em minerais críticos, SAF [combustível sustentável de aviação] ou data centers”, avalia.
A entidade prepara um documento para entregar ao governo americano com sugestões nesse sentido.
Enquanto isso, os principais setores afetados pelo tarifaço também se movimentam individualmente para serem contemplados nas negociações.
O Cecafé (Conselho dos Exportadores de Café do Brasil) informou que está realizando reuniões com o governo e que busca incluir o café na solicitação de suspensão de todas as tarifas para produtos brasileiros por 90 dias.
Como alternativa, se a suspensão não for implementada, os exportadores de café pretendem que o produto seja incluído na lista de isenções ao tarifaço, assinada por Trump em 5 de setembro.
Em nota, a Abiec (Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes) afirmou que a negociação é importante para preservar a competitividade da carne brasileira e garantir previsibilidade aos exportadores.
“O encontro [entre Lula e Trump] reforça a importância do diálogo para o fortalecimento das relações comerciais entre Brasil e Estados Unidos e demonstra a disposição de ambos os governos em avançar nas discussões sobre as tarifas atualmente em vigor”, disse a entidade através de sua assessoria de imprensa.

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